#acessibilidade Fotografia da entrada do Silo Global de Semente de Svalbard, que se estende para dentro da rocha, onde ficam localizadas as câmaras de sementes.
Catástrofes naturais, pandemias e guerras mundiais, tudo isso gera um risco iminente de extinção dos alimentos básicos e, claro, da espécie humana. Nesse cenário apocalíptico, onde conseguiríamos recuperar as espécies importantes para a nossa alimentação? A resposta é: em um banco de sementes! Nele são armazenadas variedades genéticas das espécies vegetais cultivadas, como arroz, feijão e soja. Mas aqui não estamos falando de um banco qualquer, e sim do Silo Global de Sementes de Svalbard, localizado na Noruega e conhecido como “cofre do apocalipse” ou “cofre do juízo final”.
A nossa história aqui, na verdade, é anterior à construção do grande silo. O botânico, geneticista e geógrafo russo Nikolai Vavilov (1887-1943) iniciou em 1919 uma expedição, na qual visitou dezenas de países, incluindo o Brasil. Ele era obcecado com a biodiversidade de plantas ao redor do mundo e um dos seus grandes objetivos de vida era resolver a fome mundial. Ele organizou de maneira sistemática as variedades de todas as espécies que ele pôde e, por isso, atualmente ele é considerado o pioneiro na criação de bancos genéticos.
Esses bancos genéticos têm a função de armazenar e preservar espécies cultivadas, garantindo o acesso à diversidade e à segurança alimentar. O patrimônio genético é o principal fundamento da agricultura e é vital para a manutenção das variedades vegetais.
Agora, vamos pensar em um contexto simplificado em que poderíamos utilizar os bancos genéticos. Imagine que não há variedade genética nas nossas plantações de arroz e, nesse contexto, surge um fungo altamente letal e transmissível nessas culturas. Ele seria capaz de acabar com todo o cultivo de arroz que temos. Mas, como temos um banco genético, nós cultivaríamos variedades que não são suscetíveis ao fungo e conseguiríamos garantir novas plantações de arroz. É por isso que os bancos são tão importantes!
#acessibilidade Fotografia de tubos contendo uma coleção de sementes da Índia do banco de genes do Silo Global de Sementes de Svalbard.
Os bancos genéticos precisam estar bem seguros de alterações climáticas e catástrofes naturais, já que esses são alguns contextos em que seria importante utilizá-los. Durante o planejamento do Silo de Svalbard, esse foi um dos grandes desafios: a escolha do local ideal. Assim, foi escolhido o arquipélago Ártico de Svalbard, na Noruega, a 1000 km da Noruega continental e a 1300 km ao sul do Polo Norte. Como vimos na imagem destacada deste artigo, apenas a entrada do silo fica situada do lado de fora, o restante da construção fica incrustada no monte.
O governo norueguês financiou inteiramente a construção do Silo Global de Sementes de Svalbard, que custou aproximadamente 45 milhões de kr, equivalente a 8,8 milhões de dólares no ano da construção. O armazenamento é gratuito para os usuários finais e os custos operacionais são financiados pelo próprio governo da Noruega e pela Crop Trust. Já o financiamento primário se dá por grandes organizações, como a Fundação Bill & Melinda Gates, e por outros governos.
O silo é composto por três câmaras subterrâneas de concreto que são localizadas no final de um túnel de 150 m de comprimento, a 180 m abaixo da montanha. O silo é projetado para suportar adversidades, como terremotos e o aumento do nível do mar decorrente do aquecimento global, estando a 130 metros acima do nível do mar. Além disso, tem capacidade para armazenar 4,5 milhões de variedades de culturas e cada variedade pode conter em média 500 sementes, totalizando 2,5 bilhões de sementes. A temperatura nas câmaras é de -18 ºC, garantindo a baixa atividade metabólica e mantendo as sementes viáveis por longos períodos. Elas são armazenadas e seladas em embalagens personalizadas compostas por três camadas. Por sua vez, as embalagens são lacradas em caixas que ficam armazenadas em prateleiras dentro do cofre.
Para tanto, o silo foi construído para suportar toda classe de adversidade — como terremotos, atividade vulcânica e radiação — e se encontra em um local a 130 metros acima do nível do mar para evitar que ele seja afetado em caso de que o nível do oceano aumente por conta do derretimento das calotas polares. Inaugurado em 2008, o banco de sementes fica em pleno permafrost, uma camada de solo permanentemente congelada que funcionaria como um “freezer” natural em caso de falha elétrica. Só que…
#acessibilidade Ilustração mostrando o interior do silo. É composto por uma entrada que fica na área externa do monte e, no seu interior, ficam as três câmaras que se conectam por corredores.
Apesar de todo o planejamento quanto à segurança das mudanças climáticas, o Silo de Svalbard corre risco. Relatórios climáticos apontam que a temperatura nas ilhas deve aumentar entre 7 ºC e 10 ºC. Isso deve causar o descongelamento do gelo, incluindo o permafrost que recobre o silo. Além disso, o aquecimento global pode levar a um aumento considerável na quantidade de chuvas na região e ao aumento de avalanches e deslizamentos de terra. A exemplo disso, em 2016 o silo sofreu uma grande intrusão de água devido às altas temperaturas e chuvas fortes.
Será que se estivéssemos falando de cédulas de dólar a preocupação seria a mesma? O tesouro que estamos descrevendo aqui é uma das maiores riquezas da espécie humana! Ele agrupa variedades genéticas das plantas domesticadas, que há milhares de anos nossa espécie vem selecionando e cultivando. Nosso patrimônio deve ser guardado e preservado, para que as gerações futuras possam utilizá-lo quando necessário já que, afinal de contas, apenas as sementes poderão ser colhidas.
Fontes:
Fonte da imagem destacada: Riccardo Gangale / The Royal Norwegian Ministry of Agriculture and Food
Fonte da imagem 1: The Crop Trust/Svalbard Global Seed Vault
Fonte da imagem 2: The Crop Trust
https://www.croptrust.org/our-work/svalbard-global-seed-vault/
https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/2013371/artigo-tesouro-para-o-futuro
Vídeo Inside the Svalbard Seed Vault do canal Veritasium no YouTube
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