#acessibilidade Doze dados com letras ao invés de números posicionados em cima de um jornal de finanças. Os dados formam as palavras “profit”, “loss” e “risk”, que em português significam lucro, perda e risco, respectivamente.
Texto escrito pelos colaboradores Davi Duarte e Everson Silva
Somos seres estritamente racionais ou nossa mente pode se desviar sistematicamente da lógica? Dois psicólogos laureados, pasmem, com o prêmio Nobel em Economia, propuseram que não somos tão racionais assim.
Aversão à perda (“loss aversion“), que é parte do arcabouço teórico da famosa teoria da perspectiva, foi originalmente cunhada pelo israelense Daniel Kahneman, o autor premiado com o Nobel em 2002, e seu amigo (já falecido) Amos Tversky.
Já o efeito dotação (“endowment effect“) ou efeito posse é um conceito elaborado pelo americano Richard Thaler (Nobel de 2017) – também conhecido pelo programa Paternalismo Libertário, em associação com o Governo Britânico. Mas o que significam esses conceitos? Existe uma relação entre eles? São relevantes no contexto da tomada de decisões?
Em primeiro lugar, vamos à definição de aversão à perda. De acordo com os estudos de Kahneman, “psicologicamente, uma perda vale o dobro do que um ganho equivalente.” Um experimento já famoso, utilizado por ele para comprovar isso é a aposta que ele propôs a alguns estudantes de graduação, em que perguntou:
Você toparia participar de uma aposta em que uma moeda é lançada e é preciso escolher um lado, seja cara ou coroa, em que você ganha 150$ se der o lado escolhido ou perde 100$ se der o lado não escolhido?
A julgar pela lógica da economia clássica, tal aposta vale muito a pena e se deve optar por fazê-la, mas na prática o que se viu foi que a esmagadora maioria não topou entrar na brincadeira. Como se viu, o medo de perder os cem dólares superou a expectativa de ganhar um valor 50% superior.
Vamos então à definição de Efeito Dotação, dada pelo próprio Thaler em seu livro Misbehaving:
Aquilo que você possui é parte da sua dotação (…) as pessoas valorizavam mais as coisas que já faziam parte de suas posses do que coisas que tinham apenas o potencial para isso, ou seja, acessíveis, mas não possuídas.
Muitos também conhecem esse fenômeno como ‘efeito posse‘. Thaler conta no seu livro que começou a pensar nessa ideia quando observou a seguinte situação: um professor do departamento de economia que era seu amigo tinha o costume de arrematar garrafas de vinho em leilões específicos para isso. Uma garrafa em especial ele havia comprado por dez dólares. Em valores corrigidos, ela estaria valendo cem dólares, mas quando perguntado se ele estaria disposto a vendê-la por esse valor, ele rejeitou a ideia veementemente. Embora fosse um professor de economia, ele não estava livre do efeito dotação.
Bem, ambos esses autores e suas ideias foram precursores do campo de estudo da Economia Comportamental que, ao contrário da teoria clássica, aborda as irracionalidades sistemáticas apresentadas pelos seres humanos em contextos de tomada de decisão. A princípio o efeito dotação é um dos desdobramentos possíveis da aversão à perda – pode-se citar o “viés de status quo” como outro desdobramento (aqui, o esforço básico – e a tendência humana inconsciente – é de manter as coisas como estão, pois o que é familiar assume grande preferência).
Então, agora que já conhecemos esses conceitos que dizem muito sobre nós mesmos, podemos olhar de uma forma diferente aqueles itens que acumulamos e nos desapegar de coisas que atribuímos um valor maior por medo do sentimento de perda ou porque o sentimento de posse bate tão forte em nós. Ou, quem sabe, até mesmo se aprofundar no estudo da Tomada de Decisão. Fica a dica!
Fontes:
Fonte da imagem destacada: Pixabay
Misbehaving. THALER, Richard.
Fast and Slow. KAHNEMAN, Daniel.
Undoing Projecto. LEWIS, Michael.
A arte de pensar claramente. DOBELLI, Rolf.
Guia de Economia Comportamental. ÁVILA, Flávia (org.)
Outros divulgadores:
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