(Português do Brasil) Qual a diferença entre a manteiga e a margarina? (V.5, N.9, P.1, 2022)

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#acessibillidade: Figura criada por inteligência Artificial de barras de manteiga e margarina em uma tigela.  

Texto escrito por Marcos Roberto da Silva Vicente, Lucas Lopes Samagaio e Arnaldo de Almeida Junior, discentes do Programa de Pós graduação em Ciência e Tecnologia – Química (PPG-CTQ)

A manteiga e a margarina há muito dividem não apenas o espaço nas geladeiras das nossas casas, nas mercearias e mercados mundo afora, mas também a opinião das pessoas sobre suas diferenças e qual é a melhor opção para nossa saúde. Para além do preço, que sempre será um importante item na decisão sobre qual alimento comprar (pelo menos para uma grande parcela da população), a origem da grande diferença entre as candidatas a serem espalhadas no seu pão na chapa está na matéria-prima utilizada para produção de cada uma: enquanto a manteiga é produzida a partir da gordura do leite animal sem nenhuma alteração na sua estrutura química, a margarina é produzida a partir da transformação de óleos vegetais. E aí você deve estar pensando e/ou se perguntando “e que diferença faz isso?!”, ou então “se ambas são produzidas a partir de fontes naturais, ambas devem ser boas para nossa saúde!”. Bom, vamos dar uma olhada em como a química pode nos ajudar a responder estas perguntas.

Tanto a gordura do leite de vaca utilizado na produção da manteiga quanto o óleo vegetal utilizado para obter a margarina são compostos por moléculas que se formam com átomos de carbono, hidrogênio e oxigênio, caracterizadas principalmente por uma série de carbonos conectados entre si, que chamamos de “cadeia carbônica”. O que os diferencia é a forma como esses átomos se combinam em cada caso para formar estas cadeias carbônicas. Aqui vale uma breve explicação que será útil mais adiante…

Em uma cadeia carbônica, cada átomo de carbono precisa se conectar a outros 4 átomos, sendo normalmente dois outros átomos de carbono e dois átomos de hidrogênio. Podemos imaginar essa cadeia carbônica como uma série de pessoas de mãos dadas formando uma fila, onde cada pessoa representa um átomo de carbono. Analogamente, esperamos então que exista um átomo de hidrogênio conectado à cabeça de cada pessoa, enquanto outro estaria ligado aos pés. Quando toda a cadeia carbônica é formada assim, dizemos que ela é uma cadeia saturada, ou seja, que contém o número máximo possível de átomos nessa molécula. Em algumas moléculas faltam átomos hidrogênio, e aí, os átomos de carbono acabam tendo que compensar essa falta se conectando duplamente com o átomo de carbono vizinho. Essas cadeias são chamadas de insaturadas, pois o número total de átomos presentes é inferior ao máximo de átomos possível! Agora que entendemos melhor os termos “saturados” e “insaturados”, podemos avaliar melhor a composição das matérias primas e nos processos que são utilizados para fazer a margarina e a manteiga!

Enquanto o leite de origem animal é composto por uma quantidade maior de cadeias carbônicas saturadas que insaturadas, os óleos vegetais, entre eles o óleo de soja, bastante comum nas casas dos Brasileiros, contém mais cadeias com insaturações do que cadeias com número máximo de hidrogênios. Além disso, outra importante diferença entre a manteiga e margarina está no processo pelo qual se produz cada uma: a manteiga é obtida basicamente pela remoção da gordura presente no leite (na gordura é onde estão as tais cadeias carbônicas que citamos), enquanto a margarina passa por um processo mais complexo, que envolve alterações importantes nas cadeias carbônicas que vem dos óleos vegetais. Vejamos mais detalhes a seguir!

Nesse ponto, você deve estar se perguntando: como a margarina e a manteiga podem ser feitas a partir do óleo de soja e do leite, que são líquidos enquanto a margarina e a manteiga são sólidas?! Como dissemos, a manteiga é feita basicamente de gordura removida do leite, que possui muitas cadeias carbônicas sem insaturações, apresentando-se sólida sob ligeira refrigeração. Já no caso do óleo vegetal, para que deixe de ser líquido e passe a ser sólido, é necessário eliminar as insaturações que existem em suas cadeias carbônicas. Lembram que as insaturações existiam por que o número de átomos era inferior ao máximo que possível?! Pois bem, as insaturações podem então ser removidas adicionando hidrogênios, de forma que os carbonos possam se ligar então a 4 átomos e não precisem mais recorrer aos seu átomo de carbono vizinho para fazer duas ligações. E esse processo é conhecido como hidrogenação!

Mas por que então remover as insaturações é um problema?! Isso não deveria fazer apenas com que o óleo vegetal ficasse mais parecido com a gordura do leite? Acontece que, como toda ação tem uma reação, esse processo de hidrogenação não é capaz de eliminar todas as insaturações nas moléculas, e para piorar, ele acaba mudando um pouco a forma de algumas insaturações. Lembram da nossa cadeia carbônica formada por uma fila de pessoas de mãos dadas?! Quando existe uma insaturação, há apenas um hidrogênio ligado à pessoa (carbono), que poderá estar nos pés ou na cabeça, concorda? Logo, quando duas pessoas vizinhas, cada uma faltando um átomo de hidrogênio, estiverem com o átomo de hidrogênio apenas na cabeça, chamaremos essa insaturação de “cis”. Por outro lado, uma insaturação será chamada de “trans” quando uma pessoa tiver o átomo de hidrogênio conectado à sua cabeça e a pessoa vizinha tiver o hidrogênio ligado nos seus pés! Naturalmente, as insaturações que existem nos produtos naturais são “cis”, enquanto um efeito colateral da hidrogenação é a conversão de algumas dessas insaturações para a forma “trans”, formando o que normalmente se divulga nas embalagens de alimentos como “gorduras trans”. Dessa forma, esperamos que a manteiga não contenha “gorduras trans”, enquanto existe a possibilidade de elas façam parte da composição da margarina!

Insaturacao 300x161 - (Português do Brasil) Qual a diferença entre a manteiga e a margarina? (V.5, N.9, P.1, 2022)

#acessibilidade: desenho de uma série de pessoas de mãos dadas formando uma fila, onde cada pessoa representa um átomo de carbono. Algumas pessoas possuem um hidrogênio conectado à cabeça e outro ligado aos pés. A insaturação cis é representada por duas pessoas conectadas por uma ligação dupla e um átomo de hidrogênio ligado aos pés de cada uma. A representação da insaturação trans é feita por duas pessoas conectadas por uma ligação dupla, tendo um átomo de hidrogênio ligado à cabeça de uma e outro átomo de hidrogênio ligado aos pés da outra. Fonte: Autores

Agora, conhecendo melhor o que são as insaturações, que nem toda insaturação é igual e que as composições da margarina e da manteiga são diferentes, podemos nos questionar: como essas diferenças interferem em nossa vida? A tabela abaixo apresenta algumas características. Mais detalhes, como benefícios, malefícios e alimentos que as contêm, podem ser encontrados neste site.

Gorduras saturadas

Gorduras insaturadas

Gorduras trans

Origem animal (com algumas exceções)

Origem vegetal (com algumas exceções)

Produzidas artificialmente, por hidrogenação

Sólida

Líquida

Sólida

Ligações simples de carbono

Ligações duplas entre um (monoinsaturada) ou mais (poli-insaturadas) pares de carbonos

Ligação dupla entre carbonos (tipo trans)

Antigamente, quando pouco se sabia sobre os malefícios causados no organismo pelas gorduras trans e a gordura animal era vista como um alimento que trazia risco para a saúde humana, as margarinas, mesmo contendo altos teores de gorduras trans, eram tratadas no mercado como benéficas em contraponto à manteiga. O avanço do conhecimento sobre os malefícios causados pelas gorduras trans mudou esse jogo e colocou a margarina, antes vista com bons olhos, como ruim para a saúde humana. Por outro lado, desafiou a indústria alimentícia a buscar formas de superar estes problemas, permitindo então que houvesse um avanço tecnológico capaz de reduzir ou remover as insaturações “trans” da composição das margarinas, reduzindo também os malefícios causados pela sua ingestão. De quebra, fez com que aditivos que tivessem capacidade de trazer outros benefícios (vitaminas, por exemplo) passassem a ser adicionadas à margarina, de forma que sua ingestão pudesse então ser tratada como uma boa fonte de substâncias essenciais para a manutenção da saúde.

Voltemos então aos pensamentos iniciais que devem ter passado pela sua mente. Lembram do “se ambas são produzidas a partir de fontes naturais, ambas devem ser boas para nossa saúde!”? Acredito que, após ler este texto, podemos concordar que concluir que algo é bom para nossa saúde apenas por “ser natural” é leviano! Precisamos sempre buscar compreender até que ponto as afirmações realmente exprimem as qualidades do produto que se quer vender ou se não passam de jogadas de marketing! Vejam que afirmar que a margarina é produzida a partir de fonte natural é uma verdade, mas simplesmente não contar que, entre o óleo vegetal, que de fato se obtém naturalmente, e a margarina que chega à sua mesa existe um processo considerável de modificação deste óleo, é o que fomenta a confusão entre os termos “ter uma origem saudável” e “ser um alimento saudável”! Fato inegável é que a manteiga será sempre um produto menos processado que a margarina, fazendo com que sua ingestão tenha um potencial impacto sobre a saúde inferior ao da margarina. Claramente, a quantidade ingerida também terá um peso nessa conta, pois ambas são calóricas. Então, sempre que puder, e com moderação, peça seu pão na chapa com manteiga!

Referências:

Butter vs. Margarine | Science History Institute

Fatty acids in bovine milk fat – PMC.

Trans Fatty Acids And Hydrogenated Vegetable Oils | FAQ’ s | The Food Safety Authority of Ireland

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