#acessibilidade Ilustração que mostra três seringas com, cada uma com uma vacina diferente dentro, disputando uma corrida em uma pista de atletismo.
Texto escrito pelos colaboradores Andresa Messias da Silva, Hélio Farias Campos dos Santos, Caroline Martins Dominguez e Leonardo Henrique Marcelino da Silva
A pandemia causada pelo novo coronavírus já causou a morte de mais de 1,6 milhão de pessoas (dados obtidos em dezembro de 2020) ao redor do mundo e, desde a aparição do vírus, deu-se início a uma corrida para a fabricação de uma vacina contra a Covid-19. A ciência vem se esforçando para encontrar o mais rápido possível um imunizante que seja capaz de vencer esta guerra que estamos enfrentando. Muitos países se uniram em busca de uma cura e, em setembro deste ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) listou 19 vacinas candidatas, as quais já estavam sendo avaliadas em ensaios clínicos com seres humanos. No entanto, os pesquisadores ainda afirmavam que poderia levar de 12 a 18 meses até que uma vacina estivesse pronta e segura para uso público, um tempo que muitos acham longo demais para esperar. Mas será que é realmente um tempo muito longo? Quais são as etapas de produção de uma vacina?
Já sabemos porque tomamos vacinas e como uma vacina funciona. De forma geral, o princípio da vacina consiste em expor o nosso corpo aos microrganismos causadores de doenças, estimulando o sistema imunológico a criar o anticorpo que consiga combater o vírus sem que haja a necessidade de contrair a doença. Desta forma, quando formos expostos ao vírus em si, já teremos os anticorpos necessários para combatê-lo. Entretanto, o desenvolvimento de uma vacina é um processo bem mais longo do que parece, sendo necessário vencer algumas etapas primordiais para que ela seja segura e eficiente. Para se ter uma ideia do desafio, a criação da vacina mais rápida até hoje foi a vacina contra o vírus da caxumba, desenvolvida pelo cientista Maurice Hilleman, que levou 4 ANOS para ficar pronta.
O desenvolvimento de uma vacina consiste em 3 etapas. Vamos entender como é cada uma dessas etapas e o que foi feito até agora para a produção da vacina contra o Covid-19.
Etapa 1: busca de antígenos
A primeira etapa é realizada pelos pesquisadores visando achar substâncias que possam estimular o nosso organismo a montar uma defesa contra o vírus. Essas substâncias são chamadas de antígenos e se assemelham ao microorganismo causador da doença. Centenas de potenciais vacinas contra a Covid-19 venceram esta etapa nos primeiros meses após cientistas de todo o mundo terem recebido o código genético do coronavírus. Alguns pesquisadores trabalham com vacinas “inativadas”, ou seja, que usam o vírus inteiro como composição da vacina, mas em estado morto ou enfraquecido (atenuado). Outras vacinas em desenvolvimento, incluindo as que tiveram mais sucesso, contam com o uso de parte do material genético do coronavírus, para que nossas células possam produzir temporariamente as proteínas necessárias para estimular nosso sistema imunológico.
Após a conclusão desta etapa, são realizados diversos testes científicos que são usados para fornecer outras informações sobre a segurança e eficiência da vacina produzida. Esses testes são divididos em duas etapas e são, sem dúvidas, a parte mais importante e determinante do desenvolvimento.
Etapa 2: Ensaios pré-clínicos
A etapa 2 é chamada de ensaios pré-clínicos e consiste em testes laboratoriais in vitro e in vivo. Os testes in vitro utilizam células humanas ou de outros animais, que estão contaminadas com o vírus e uma série de estudos são feitos para demonstrar se a vacina produzida induz uma resposta imune, protegendo o organismo contra a doença. Porém, este tipo de teste é limitado, pois as células estudadas não conseguem reproduzir a complexidade de um organismo vivo. Por este motivo, são feitos os testes in vivo que utilizam modelos vivos de animais para obter uma resposta mais segura e correta sobre os efeitos da vacina. Estes testes normalmente levam anos para serem concluídos, mas como muitos grupos de pesquisa já tinham agentes que apresentaram eficácia nos testes da etapa 2 para outros vírus da família do coronavírus, como por exemplo, para os causadores da SARS e da MERS, esses grupos só tiveram que adaptar sua tecnologia ao novo coronavírus. Se a etapa 2 for bem-sucedida, a vacina entra na etapa 3 que determinará a diferença entre uma vacina promissora e uma comprovada.
Etapa 3: Estudos clínicos
A etapa 3, chamada de estudos clínicos, é longa e dividida em 3 outras fases. Inicialmente, na fase 1, é testada em um pequeno grupo de pessoas (algumas dezenas ou centenas), a eficácia e a dosagem segura da vacina que posteriormente será distribuída para o restante da população. Na fase 2, após a apresentação dos resultados positivos do agente imunológico, é determinado em quanto tempo e por quanto tempo a vacina traz imunidade para a pessoa. Nesta fase, de uma centena a alguns milhares de pessoas de várias idades e regiões do mundo são expostas à vacina e, após um período de alguns meses, avalia-se se estes indivíduos desenvolveram imunidade contra o vírus e não apresentaram sintomas da doença. Em seguida, na fase 3, a vacina é testada em um grupo de milhares a dezenas de milhares de voluntários. Esse grupo é extremamente heterogêneo e tem muitas variações em relação a idade, etnia e sexo. Assim, os pesquisadores conseguem demonstrar a eficácia da vacina, sua dose terapêutica e monitorar se ela não causa nenhum efeito colateral grave durante os testes em uma população de indivíduos. Caso a vacina obtenha resultados satisfatórios, obtém-se o registro sanitário e, após isso, ela é DISTRIBUÍDA PARA POPULAÇÃO. Ufa!!
Normalmente o desenvolvimento de uma vacina é um processo demorado, podendo levar anos e consumir uma quantidade elevada de recursos financeiros. Porém, devido à urgência que se estabeleceu no mundo por conta da COVID-19, algumas fases de testes foram realizadas de forma simultânea. Dessa forma, somados aos esforços de pesquisadores ao redor do mundo, houve um decréscimo considerável no tempo de obtenção de uma vacina. Das 214 vacinas que estão sendo desenvolvidas em todo o mundo, 162 ainda estão na fase de testes pré-clínicos e 52 em testes clínicos, sendo 13 já estão na fase final da etapa 3. Destas, quatro estão sendo testadas no Brasil. O uso emergencial da vacina da americana Pfizer, feita em parceira com a empresa Alemã BioNTech, foi aprovado no Reino Unido, onde a vacinação já começou. O uso emergencial da vacina foi seguido pelos Estados Unidos e Canadá.
Aqui no Brasil, a vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan e pela empresa Sinovac também anunciou recentemente a entrega dos resultados dos testes clínicos com os voluntários à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e aguarda a autorização do órgão para iniciar a entrega da vacina. O objetivo é que a vacina seja liberada ainda em 2020!! Este tempo de produção tão curto é inédito no desenvolvimento de vacinas e nos dá a esperança de que, em um futuro próximo, mais vacinas poderão sair nessa mesma velocidade, trazendo assim uma maior proteção para a população e erradicando várias doenças endêmicas e pandêmicas.
Fontes:
Fonte da imagem destacada: Illustration by James Melaugh | The Guardian
http://www.butantan.gov.br/noticias/teste-de-vacina-contra-o-coronavirus-comeca-em-mais-4-centros
https://veja.abril.com.br/noticias-sobre/vacina/
https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/covid-19-vaccines