#acessibilidade Imagem de um vírus SARS-CoV-2, causador da COVID-19.
Texto escrito pelo colaborador Ricardo Sawaya
O próximo contaminado pode ser você. Fui eu!
Você não aguenta mais essa situação surreal na qual vivemos nesses últimos oito meses? Esse é o tempo que se passou desde que foi decretada a pandemia de COVID-19. Até parece que faz muito mais tempo. Máscaras, álcool gel, sapatos nas portas, cumprimentos usando os punhos ou cotovelos, mínimo contato físico e social. Como bons macacos, o mais difícil para nós é sem dúvida o isolamento social (veja um vídeo legal sobre evolução humana aqui). Deve ser por isso que acabamos relaxando as medidas de isolamento. E a cada pequena concessão que fazemos, corremos maior risco. Já sabemos que o nosso comportamento define de forma muito importante como a pandemia acontece (veja matéria recente da Agência FAPESP aqui). Mesmo assim, muitos de nós tem aceitado o risco de encontrar pequenos grupos de amigos ou familiares que “também se protegem”. Como biólogo e leitor de novidades e boas evidências científicas sobre a pandemia, sempre defendi o isolamento social, o máximo possível. Mesmo considerando e tentando compreender todo o impacto social e econômico que tudo isso traz. Mas assim como muitos amigos e familiares, também comecei a abrir pequenas exceções, acreditando que não me arriscava muito. E foi assim que fui infectado por um parente próximo.
Minha saúde nunca esteve tão boa quanto antes da COVID-19. Não pertenço a nenhum grupo de risco, não estou nada acima do peso e pratico atividades físicas regularmente. Na minha primeira semana, senti apenas sintomas típicos de gripe: febre baixa, «corpo moído», cansaço e necessidade de dormir muito, mas entre o oitavo e décimo dia a tosse seca aumentou e sentia dor no peito a cada respirada! Tinha acessos de tosse assustadores. Algumas vezes, no meio da noite, tinha que me levantar da cama e caminhar para conseguir respirar. Não tive que ir para o hospital, felizmente, mas nesses três piores dias, senti muito medo. Hoje, pouco mais de 40 dias depois dos primeiros sintomas, me sinto bem melhor, mas ainda não consigo fazer nem 20% da atividade física que era capaz antes de ser infectado. Minha recuperação total pode durar várias semanas ou meses. Mesmo que a minha experiência com a COVID-19 tenha sido relativamente leve, foi muito difícil e amedrontadora e me fez imaginar de forma muito mais clara o que deve passar pela cabeça dos que tem que ser internados, entubados ou passam dias ou semanas em uma UTI. Mais de 160.000 pessoas morreram no Brasil pela COVID-19 nesses oito meses de pandemia. O número diário de mortes ainda corresponde a centenas de mortes todos os dias!!! Mesmo assim, o que vemos a cada dia é as pessoas relaxarem mais e mais as práticas de prevenção do contágio. Ou mesmo não darem tanta importância a todas essas mortes.
Em um artigo científico recente, o professor José Paulo Guedes Pinto, da UFABC, e colegas da USP, Reino Unido e Colômbia, tentam explicar porque o número de mortes na cidade de São Paulo diminuiu. Apesar de boa parte da população estar desobedecendo cada vez mais as medidas de isolamento social. E não foi pela tão comentada imunidade de rebanho. A hipótese desses pesquisadores é a de que «bolhas de proteção» se formaram na cidade. Essas bolhas formariam grupos com muitos infectados e grupos quase sem infectados. E as bolhas não interagem muito. Isso explicaria porque o número de infecções e mortes na cidade desaceleraram. Mas modelos matemáticos criados por eles indicam que a diminuição do isolamento social e a entrada de apenas uma pessoa infectada no sistema poderiam «estourar» essas bolhas e nos levar a uma segunda onda da doença. E ela poderia ser ainda maior que a primeira se o isolamento social for muito baixo (leia mais sobre o artigo aqui; ou o artigo completo em inglês ainda não revisado por pares aqui). Nesse momento, vários países do mundo voltam a tomar medidas rígidas de isolamento devido ao aumento do número de casos ou uma segunda onda da doença ameaça novamente encher as UTIs. Não adianta. Até uma vacina estar disponível a todos, o que deve levar ainda muitos meses (veja aqui), a melhor forma de evitar a doença é usar a máscara corretamente, lavar ou higienizar as mãos com álcool gel e manter o isolamento social o máximo possível. Ou você acha que vale à pena arriscar? Achar que vai morrer, morrer ou mesmo causar a morte de uma pessoa querida de sua família?
Fontes:
Fonte da imagem destacada: Mockups Design
Evolução humana. Nerdologia Ensina 12.
No combate à COVID-19, o comportamento humano pode ser parte do problema ou da solução. Agência FAPESP. 16 de novembro de 2020.
Entenda o que é a imunidade de rebanho – e por que ela nem sempre funciona. Revista Galileu.
AÇÃO COVID-19. Bolhas de Proteção: um estudo sobre a queda na curva epidêmica na Cidade de São Paulo mesmo com a redução do distanciamento social. São Paulo: Ação Covid-19, 2020.
Local protection bubbles: an interpretation of the decrease in the velocity of coronavirus’s spread in the city of Sao Paulo. Jose Paulo Guedes Pinto, Patricia Camargo Magalhaes, Gerusa Maria Figueiredo, Domingos Alves, Diana Maritza Segura-Angel. medRxiv 2020.08.11.20173039; doi: https://doi.org/10.1101/2020.08.11.20173039
Vacina contra covid-19: 10 razões para sermos realistas sobre imunização e não esperarmos um milagre. BBC News Brasil. Jose M. Jimenez Guardeño e Ana María Ortega-Prieto. 07 de outubro de 2020.
O poder das máscaras na luta contra o coronavírus. Cesar Baima. Instituto Questão de Ciência. 29 de outubro de 2020.
Apresentação correta de dados indica benefício do isolamento social em SP. Marcelo Yamashita. Instituto Questão de Ciência. 08 de junho de 2020.
Para saber mais:
Guia Entusiastas da Ciência, Especial Coronavírus
Outros divulgadores:
Youtube: Atila Iamarino
Youtube: Instituto Questão de Ciência