#acessibilidade Embalagem de aspirina e, ao fundo, cascas de salgueiro armazenadas em recipiente aberto.
Imagine que você é um cidadão grego vivendo há 2 mil anos atrás. Infelizmente você sofre de dores intensas devido a uma inflamação na perna e vai consultar um médico para solucionar esse problema. E o médico te prescreve aspirina! É sério isso? Na verdade, ele te indica um tônico de casca de salgueiro, que ao longo dos milhares de anos se tornou o que conhecemos hoje como aspirina.
O ácido acetilsalicílico ficou conhecido como aspirina devido ao nome da marca que popularizou o medicamento, mas sua história remonta desde a antiguidade. Ele é obtido a partir da salicilína, que está presente em diversas plantas como colchicina, murta, e, claro, o salgueiro. Essas plantas já eram importantes, mesmo antes do surgimento da indústria farmacêutica! Não à toa, existem indicações do uso de infusão de folhas de murta nos papiros de Ebers, um tratado médico egípcio de aproximadamente 1.500 a.E.C.
O salgueiro é encontrado no mundo todo e os relatos mais antigos de seu uso datam dos povos sumérios, no qual tabletes escritos há 4 mil anos indicam seu uso como planta medicinal no alívio de dores. Registros arqueológicos assírios datados de 2 mil a 3,5 mil anos atrás também fazem a mesma indicação. Já o famoso grego Hipócrates, pai da medicina, relata por volta de 400 a.E.C o uso da casca de salgueiro para aliviar dores e febres. O salgueiro continuou presente na medicina popular ao longo de milhares de anos, mas a medicina científica acabou esquecendo-o.
Foi apenas no século XVIII que o salgueiro foi redescoberto. Acidentalmente o britânico Edward Stone provou a casca da árvore e se impressionou com seu amargor; imediatamente o associou a uma outra planta muito utilizada no período para tratar malária. Na sua época ele utilizou a Doutrina de Assinaturas de Paracelso, um antigo estudo que traçava um paralelo entre uma planta e sua capacidade de cura. Ele comparou o formato das folhas e outras características do salgueiro para compreender como poderia ser utilizado medicinalmente.
#acessibilidade Fotografia de um salgueiro com outras árvores ao fundo.
Ele preparava um pulverizador de casca de salgueiro seco e testava em pacientes. O resultado foi o alívio de febres e outros distúrbios em 50 pessoas! Stone escreveu uma carta em 25 de abril de 1763 ao presidente da Royal Society, explicando seu estudo e trazendo à luz da comunidade científica as propriedades anti-inflamatórias, antipiréticas e analgésicas da casca do salgueiro.
Isso gerou grande repercussão e a partir daí os cientistas buscaram isolar o princípio ativo. A primeira vez que a salicina foi isolada foi em 1828 pelo alemão Joseph Buchner. No ano seguinte, em 1829, o farmacêutico francês Henri Leroux aperfeiçoou o processo de extração e conseguiu extrair 30 g de salicilina em 1,5 kg de casca de salgueiro. Anos depois, em 1838, o químico italiano Raffaele Piria converteu a salicilina em um açúcar aromático, o levou à hidrólise e à oxidação, obtendo o ácido salicílico.
A extração do ácido era muito difícil, mesmo com as tentativas de aprimoramento, como a de Buchner. No século XIX alguns químicos conseguiram sintetizar o ácido salicílico de diversas formas, mas existem divergências quanto a quem foi o primeiro a conseguir o feito, além de existir polêmicas quanto a quem deve ser creditada a padronização da fórmula. O fato é que seu uso cresceu, mas era acompanhado de efeitos colaterais, o que limitava sua utilidade.
No final do século XIX a indústria farmacêutica Bayer registrou o ácido acetilsalicílico, derivado do ácido salicílico. Foi aí que deram o nome de aspirina e ela ficou conhecida internacionalmente. Foi o primeiro medicamento comercializado na forma de tablete, pois era difícil dissolver o pó completamente e também evitava adulteração e dosagens erradas. Se tornou muito popular, chegando até a parar no Guinness Book de 1950, como medicamento mais popular do mundo!
#acessibilidade Antigas embalagens de aspirina.
Embora as diversas formas da aspirina já nos acompanhem há milhares de anos, foi apenas recentemente que conseguimos compreender seu funcionamento com maiores detalhes! Em 1928 o inglês John Vane ganhou o Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina por descrever o mecanismo de ação da aspirina e ao longo das décadas foram desenvolvidos estudos mais profundos. Agora, em 2022, o medicamento faz 116 anos de contínua produção e é utilizado por mais de 200 milhões de pessoas no mundo todo!
Fontes:
Fonte da imagem destacada: montagem – Imagem 1 e Imagem 2
Fonte da imagem 1: Thomas Winz / Photodisc / Getty
Fonte da imagem 2: HUGO GAMBOA/Bayer
https://bdm.unb.br/bitstream/10483/4095/2/2011_RicardoOliveiraMonteiroLopes.pdf
http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Revista&id=836
https://drauziovarella.uol.com.br/drauzio/a-descoberta-da-aspirina-artigo/
https://www.revistasauda.pt/saudeAZ/Pages/SaudeAaZ.aspx?article=3034
https://stringfixer.com/pt/Reverend_Edward_Stone
https://saude.abril.com.br/coluna/tunel-do-tempo/a-aspirina-nao-foi-inventada-pelos-nazistas/