(Português do Brasil) Como o Mercúrio Mudou o Mundo (V.8, N.8, P.4, 2025)

Facebook Twitter Instagram YouTube Spotify WhatsApp

Sorry, this entry is only available in Português do Brasil. For the sake of viewer convenience, the content is shown below in the alternative language. You may click the link to switch the active language.

Reading time: 5 minutes

Sorry, this entry is only available in Português do Brasil. For the sake of viewer convenience, the content is shown below in the alternative language. You may click the link to switch the active language.

#acessibilidade: A imagem apresenta um fundo escuro, diversas pequenas gotas prateadas de mercúrio formando esferas irregulares, com brilho metálico, saindo de um frasco. Fonte: WikiCommons

Texto escrito pela colaboradora Ana Carolina Murato Iavarone

Ao longo da história, poucos elementos despertaram tanto fascínio, medo e curiosidade quanto o mercúrio (Hg). Ao contrário dos demais metais, o mercúrio apresenta-se como um líquido prateado, denso e reluzente à temperatura ambiente. Suas gotas não se misturam, nem são absorvidas por superfícies porosas, como uma esponja, elas simplesmente se separam e escapam, como que brincando com as leis da física que sempre estudamos. Essas características singulares intrigam cientistas desde a Antiguidade. Mas por que o mercúrio se comporta assim? E qual o papel que ele desempenhou em diferentes momentos da história humana? Vem descobrir com a gente!

Essa natureza incomum do mercúrio é explicada por efeitos relativísticos que atuam sobre os elétrons mais internos de seu átomo. Esses elétrons se movem a velocidades altíssimas, o que altera o comportamento químico do elemento e impede a formação das tradicionais ligações metálicas. O resultado é esse fluido metálico de aparência hipnotizante que escorre como água, desafiando expectativas e encantando observadores ao longo dos séculos. Mas cuidado! Não são “águas claras” e seguras para se tocar!

Desde os tempos antigos, o mercúrio foi cercado de misticismo e simbolismo. Na China imperial, acreditava-se que ele tinha o poder de conceder a imortalidade. O imperador Qin Shi Huang, conhecido por unificar a China no século III a.C., consumia elixires à base de mercúrio, em altas taxas,  em busca da vida eterna. Tragicamente, e, ironicamente, acredita-se que o próprio mercúrio tenha contribuído para sua morte prematura por envenenamento. Seu lendário mausoléu, descrito pelo historiador Sima Qian, incluiria rios artificiais de mercúrio representando os cursos d’água do império. Pesquisas modernas de solo na região indicam que esse relato pode ter fundamento. Portanto, a vontade de alguns pesquisadores de apenas não escavar e não entrar em contato com esta área é de medo geral!

image2 - (Português do Brasil) Como o Mercúrio Mudou o Mundo (V.8, N.8, P.4, 2025)
Imagem de restauração do mausoléu do primeiro imperador de Qin – autor Che Tianyi- Quora

Com o tempo, o uso do mercúrio expandiu-se além da alquimia e das crenças espirituais, alcançando a área da medicina. Durante a Idade Média e a Renascença, compostos mercuriais eram comumente usados no tratamento de doenças como a sífilis, muito antes da descoberta dos antibióticos. O problema é que pouco se s se abia sobre seus efeitos tóxicos cumulativos. O vapor de mercúrio metálico é extremamente perigoso: afeta o sistema nervoso central e pode causar sintomas que variam de tremores a alucinações.

Vale a curiosidade: a expressão inglesa “mad as a hatter” (louco como um chapeleiro) e o próprio termo “Chapeleiro Maluco” surgiram justamente porque os fabricantes de chapéus usavam nitrato de mercúrio no processo de moldagem de feltros e, com o tempo, desenvolviam graves distúrbios neurológicos que provocavam sintomas de “loucura”.

Adicionalmente, no século XX, o mercúrio foi protagonista de uma das maiores tragédias ambientais já registradas: o caso de Minamata, no Japão. Durante décadas, uma indústria local despejou resíduos de metilmercúrio no mar, contaminando a vida marinha e envenenando milhares de pessoas que dependiam da pesca. Essa contaminação, através da bioacumulação e biomagnificação do metilmercúrio nos organismos marinhos, afetou gravemente a população local, especialmente aqueles que consumiam peixes e frutos do mar contaminados. Os sintomas foram devastadores: convulsões, deformações, paralisias e, em muitos casos, a morte. A doença de Minamata se tornou um símbolo dos perigos da negligência ambiental e impulsionou mudanças globais nas políticas de segurança. Esse episódio culminou na criação da Convenção de Minamata, em 2013:  um tratado internacional que regula o uso e o descarte responsável do líquido misterioso.

Mesmo com seus riscos conhecidos, o mercúrio ainda é utilizado em contextos restritos, como na produção de amálgamas dentárias, lâmpadas fluorescentes e equipamentos científicos. No entanto, seu uso vem sendo progressivamente substituído por alternativas mais seguras e sustentáveis. Junto a isso, a tecnologia culminou na facilitação do acesso à informação. Então, caso uma lâmpada fluorescente caia na sua casa, NÃO colete manualmente e de modo ordinário; procure sempre o descarte responsável, a fim de evitar complicações de saúde. 

Mais do que um elemento químico, o mercúrio é um símbolo poderoso das lições que aprendemos ao longo da história. Ele nos mostrou os limites da curiosidade sem conhecimento, os riscos de lidar com substâncias desconhecidas e a importância de aliar ciência, responsabilidade e ética, ambiental, principalmente. Ao transformar mistérios perigosos em sabedoria aplicada, o mercúrio nos lembra que a ciência é, acima de tudo, uma ferramenta de aprendizado sobre o mundo, sobre nós mesmos e sobre os impactos de nossas escolhas, e que podemos usufruir da tecnologia e sabedoria para podermos utilizar elementos que favoreçam áreas em nossa sociedade, culminando na evolução científica!

Fontes:

Nature’s Building Blocks: An A–Z Guide to the Elements – Emsley, J.

Clarkson, T. W., Magos, L., & Myers, G. J. (2003). The toxicology of mercury—current exposures and clinical manifestations. New England Journal of Medicine, 349(18), 1731–1737.

Harada, M. (1995). Minamata disease: methylmercury poisoning in Japan caused by environmental pollution. Critical Reviews in Toxicology, 25(1), 1–24.

Emsley, J. (2001). Nature’s Building Blocks: An A-Z Guide to the Elements. Oxford University Press.

World Health Organization. (2008). Mercury and Health Fact Sheet.

Sima Qian. (ca. 100 a.C.). Shiji (Registros do Historiador) – relato sobre o túmulo de Qin Shi Huang.

United Nations Environment Programme. (2013). Minamata Convention on Mercury.

Para saber mais:

Documentário: Minamata (2020), com Johnny Depp, aborda o desastre ambiental.

Howes, L. “Relativity behind mercury’s liquidity” – Chemistry World

Wikipedia – “Relativistic quantum chemistry” e “Minamata disease

Verywell Health e PAHO/WHO sobre Minamata tandfonline.com+13verywellhealth.com+13paho.org+13 

Why is there so much fear of opening the tomb of China’s first emperor?Che Tianyi

Outros divulgadores:

  • Canal MinuteEarth (no youtube): vídeos sobre poluição por mercúrio.
  • Podcast Science Vs: episódio “Mercury” discute efeitos ambientais.
  • Blog Environmental Health News: publica pesquisa e notícias sobre exposição ao mercúrio.
Compartilhe: