A modificação genética em plantas e suas implicações (V.5, N.6, P.3, 2022)

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Tempo de leitura: 6 minutos
#acessibilidade: a imagem contém três vasos com uma planta genérica em cada um, sendo uma maior que a outra (da esquerda para a direita) no intuito de representar seu crescimento. 

Texto escrito por Camila Schaaf Benfica com revisão de Wagner Rodrigo de Souza e Lívia Seno Ferreira Camargo

Você já ouviu falar de plantas geneticamente modificadas (PGM)? Talvez as conheça como plantas transgênicas, ou como OGMs. As plantas geneticamente modificadas são plantas que tiveram seu DNA alterado em laboratório. Pode parecer até coisa de ficção científica, mas é uma realidade e atualmente elas estão por toda parte!

Já faz muito tempo que a raça humana começou a alterar a natureza, os primeiros agricultores praticavam a seleção artificial de plantas ao escolher as melhores e mais bonitas espécimes para propagar. Assim, as plantas foram domesticadas e aos poucos selecionadas para características desejáveis. Você sabia que a couve-de-bruxelas, o brócolis, a couve-flor, o repolho, a couve e a mostarda são todas variedades de uma mesma espécie? Essa espécie é a Brassica oleracea L., que tem sido cultivada por pelo menos 2 mil anos. Cada um desses vegetais que comemos foi resultado da seleção da planta selvagem para desenvolver as características desejadas, esse efeito é causado pelo aumento, diminuição ou modificação da expressão de genes determinados.

Mas alterar diretamente a genética da planta já é outra história. A primeira planta que teve seu genoma modificado foi o tabaco, em 1983, e como resultado, esta planta desenvolveu resistência a antibióticos. Em 1994, a primeira planta transgênica começou a ser comercializada, e era uma variedade de tomate que demorava mais para amadurecer, facilitando a logística de sua comercialização. A partir daí muitas outras PGMs foram desenvolvidas e começaram a ser utilizadas. Atualmente, além de representarem boa parte dos cultivares utilizados na agricultura, as PGMs são utilizadas na produção de combustíveis, cosméticos, fármacos e outros.

O uso das plantas geneticamente modificadas já causou muita controvérsia na opinião popular, então, buscaremos entender como essas plantas funcionam, e quais as principais preocupações acerca do seu uso. De forma simplificada, quando uma PGM é criada busca-se conferir uma característica nova a este organismo. Primeiramente é necessário entender que o nosso DNA – assim como o das plantas – contém as informações para produzir proteínas que desempenham funções específicas no corpo e regulam todos os processos biológicos dentro do corpo. Quando falamos de modificação genética, estamos nos referindo a alterações feitas no DNA.

De forma geral, para produzir plantas modificadas identificamos genes em outro organismo (planta, animal ou microrganismo) que produzem características desejadas – por exemplo, resistência a seca, a pragas ou a herbicidas – copiamos este gene (que contém a informação), e inserimos na planta, o que pode ser feito com células isoladas ou na planta já adulta. Existem uma variedade de métodos para fazer isso, um dos mais comuns é via Agrobacterium tumefaciens: esta é uma bactéria presente no solo que naturalmente é capaz de introduzir um pedaço de gene nas plantas hospedeiras por meio de um DNA circular chamado plasmídeo. Esse gene inserido causa o crescimento anormal de células da planta, gerando uma doença conhecida por galha-da-coroa, que é como um tumor. A bactéria se alimenta das substâncias deste tumor e das substâncias produzidas por ele. Para utilizar essa bactéria na transformação das plantas, os cientistas removem o gene causador do tumor e o substituem pelo gene de interesse, que confere à planta certa característica desejada, utilizando o restante do maquinário do plasmídeo para inserir o gene alvo na célula vegetal.

Mas… Será que as modificações genéticas nestes organismos representam algum risco para a saúde humana ou para o meio ambiente? Quais são as vantagens e desvantagens de sua utilização? Muitas pessoas acreditam que o consumo dos alimentos geneticamente modificados pode causar problemas de saúde como distúrbios gastrointestinais, obesidade, diabetes, doenças cardíacas, infertilidade, câncer e até doença de Alzheimer. Essas alegações são infundadas e não existem evidências científicas que apontam relação direta entre os alimentos modificados e estas doenças, mas sim aos hábitos alimentares modernos, com o consumo de alimentos ultraprocessados. Na verdade, as plantas geneticamente modificadas podem ser projetadas justamente para melhorar a saúde, podendo ter alterações que as tornam mais nutritivas, como o Golden Rice, que foi desenhado para produzir beta caroteno, um precursor da vitamina A. As culturas geneticamente modificadas também ganharam reputação de serem alergênicas, porém são tão alergênicas quanto culturas convencionais, uma vez que o alvo da alteração genética não havia sido a remoção dos componentes que causam a alergia. Mas existem sim variedades desenhadas para diminuir e até acabar com a alergia, recentemente cientistas estão usando a tecnologia para modificação de genes chamada CRISPR-Cas9 que está sendo utilizada para produzir trigo sem glúten e amendoins antialérgicos.

Em relação ao impacto ambiental existem muitas outras preocupações. É necessário frisar que qualquer tipo de agricultura gera um impacto ambiental por si só, independente de serem culturas convencionais ou modificadas. Uma pauta que dá força aos argumentos anti-OGM é o uso de plantas resistentes ao glifosato, que ficaram famosas após escândalos associados à empresa Monsanto. O glifosato é um herbicida utilizado para matar ervas daninhas, e as culturas modificadas para resistir a este veneno permitem a pulverização das plantações sem destruir a produção, porém, alguns tipos de ervas daninhas têm desenvolvido resistência a este herbicida, o que faz com que a aplicação tenha que ser feita cada vez com maior quantidade. Este sim é um produto cancerígeno e tóxico, e atualmente banido em diversos países. Esta questão é muito mais relacionada a como as plantações são conduzidas do que aos OGMs em si.

Inclusive, as PGMs podem auxiliar o desenvolvimento mais sustentável da agricultura. Com o uso da engenharia genética, é possível criar plantas que são mais produtivas, que crescem mais rápido, ou que dão frutos o ano todo, por exemplo. Também é possível criar cultivares mais resistentes à seca, e que aproveitam melhor a água. Além de plantas resistentes a pragas e doenças, que diminuiriam as perdas na produção. Desta forma, a utilização das PGMs se faz cada vez mais necessária em um mundo com a população crescente: é esperado que em 2050 a população mundial chegue a 9 bilhões de pessoas, e atualmente a área utilizada pela agricultura já corresponde a 40% de toda a área terrestre do planeta, por isso devemos buscar a otimização cada vez maior de nossas plantações.

As PGMs também são utilizadas em outros contextos: em 2014 plantas geneticamente modificadas foram utilizadas para produzir um medicamento contra o vírus Ebola: utilizando expressão transiente em Tabacco foi possível produzir a droga ZMapp, uma combinação de anticorpos humanos que reconhecem a glicoproteína do vírus e auxiliam no tratamento da doença. Apesar da produção em larga escala utilizando essas técnicas ainda ser reduzida, são métodos adequados para emergências de saúde que precisem de uma resposta rápida. Em 2012, vacinas contra o vírus H1N1 foram produzidas com PGMs em apenas um mês, sendo que a produção convencional feita com ovos de galinha chega a durar 6 meses.

Sendo assim, percebemos que as PGMs são muito abrangentes e podem ser utilizadas em uma diversidade de contextos. Cada vez mais, a ciência melhora e auxilia no desenvolvimento de novas tecnologias, trazendo benefícios a toda a sociedade!

Fontes:

Fonte da imagem destacada: Imagem de OpenClipart-Vectors por Pixabay 

Goldstein, D. A. (2014). Tempest in a Tea Pot: How did the Public Conversation on Genetically  Modified Crops Drift so far from the Facts? Journal of Medical Toxicology, 10(2), 194–201. doi:10.1007/s13181-014-0402-7

SANDEEP, K., et al. (2021). CRISPR-Cas in Agriculture: Opportunities and Challenges. Frontiers in Plant  Science. Volume 2. doi: 10.3389/fpls.2021.672329

Kumar, K., Gambhir, G., Dass, A., Tripathi, A. K., Singh, A., Jha, A. K., … Rakshit, S. (2020). Genetically  modified crops: current status and future prospects. Planta, 251(4). doi:10.1007/s00425-020-03372-

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