#acessibilidade: A imagem é uma fotografia numa noite avermelhada, com uma das pirâmides egípcias com grande destaque ao centro e a Lua, bem alaranjada, no canto superior direito.
Texto escrito pelo colaborador Lucas Orfei
A história humana, embora curta em termos astronômicos, ainda é repleta de mistérios para a contemporaneidade. De pirâmides nas Américas a construções antigas na Ásia, grande parte dos legados de civilizações antigas se perderam e é papel dos arqueólogos e arqueólogas investigarem monumentos para que possamos preservar esses patrimônios históricos.
Por séculos, o interior das pirâmides permaneceu inacessível ou apenas superficialmente explorado, com os profissionais da arqueologia tendo pouca certeza sobre as câmaras e passagens ocultas que podem existir dentro delas. O que ninguém esperava é que uma das soluções para isso viesse de partículas que chovem no céu! Vamos investigar quem são elas.
Elas são geradas pelos raios cósmicos, partículas carregadas que surgem em diversos processos astrofísicos pelo Universo, como por exemplo explosões de estrelas (supernovas). Essas partículas viajam pelo espaço próximas à velocidade da luz e são muito energéticas. Quando interagem com a atmosfera terrestre, produzem um “zoológico” de partículas (por mais estranho que pareça, os físicos usam esse termo mesmo, veja mais sobre esse exótico zoo aqui) e uma delas é o múon. Inclusive, falamos recentemente sobre a super energética partícula Amaterasu.
Os múons têm um caráter extremamente penetrante e conseguem atravessar grandes massas de matéria, como pedras e concreto. De maneira semelhante ao funcionamento da radiografia com raios-x, os cientistas podem usar os múons produzidos na atmosfera para estudar estruturas arqueológicas!
Colocando detectores de partículas dentro (quando possível) e ao redor das pirâmides, é possível descobrir quantos múons passam por elas e quantas são absorvidas. À medida que os múons atravessam a pirâmide, os sensores registram as mudanças nas partículas, como a velocidade e a direção. A partir dessas medições, é possível reconstruir uma imagem tridimensional do interior da estrutura e chamamos isso de muongrafia!
Essa técnica tem várias vantagens: ela é não invasiva, ou seja, não danifica os monumentos; é capaz de penetrar grandes espessuras de material sem a necessidade de perfurações ou escavações; e permite uma visualização em tempo real do que está ocorrendo dentro da estrutura.
Em 2016, uma equipe internacional de cientistas utilizou essa tecnologia para investigar a Grande Pirâmide de Gizé, revelando a existência de uma grande câmara desconhecida, com cerca de 9 metros de comprimento. Esta descoberta foi um marco significativo, pois demonstrou o potencial da muongrafia para explorar áreas inacessíveis sem a necessidade de escavações invasivas. De certa forma, as estrelas estão nos ajudando a entender a nossa própria história!
Ainda, é possível usar essa técnica para investigar o interior de vulcões, cavernas e outras estruturas. O que mais será que os múons estão escondendo da gente?
Conheça mais sobre o projeto ScanPyramids que pretende escanear as pirâmides do Egito!
Leia mais sobre a técnica de muongrafia: https://www-pub.iaea.org/MTCD/Publications/PDF/TE-2012web.pdf (en)
Imagem destacada: Chemist.wael, CC BY-SA 4.0 <https://creativecommons.org/licenses/by-sa/4.0>, via Wikimedia Commons