A Importância da filosofia da ciência (V.8, N.3, P.2, 2025)

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Tempo de leitura: 5 minutos
#acessibilidade: Fotografia astronômica de um grupo de cinco galáxias próximas umas das outras. Na imagem, aparecem centenas de outras galáxias mais distantes, menores na foto. As cinco galáxias principais têm núcleos brancos brilhantes, com tamanho, forma, estrutura e coloração diferentes. Espalhadas pela imagem, também é possível ver estrelas.

Texto escrito pelo colaborador Fulvio Andres Callegari

A ciência é uma atividade humana que busca a verdade sobre a realidade com a investigação sistemática e empírica dos diversos fenômenos naturais e da formulação de leis e teorias que corretamente descrevam estes fenômenos. A partir deste conhecimento, podemos então predizer novos fenômenos e, eventualmente, controlar e manipular alguns elementos do nosso entorno com o objetivo de melhorar a nossa qualidade de vida desenvolvendo as tecnologias. No entanto, a ciência não é imune a erros e interpretações equivocadas. É nesse ponto que a filosofia da ciência entra em cena, fornecendo um arcabouço conceitual e metodológico para avaliar criticamente as teorias e práticas científicas.

A filosofia da ciência é o campo de estudo que se dedica à análise dos fundamentos, métodos e implicações da ciência, desempenha um papel fundamental na busca por um conhecimento rigoroso e confiável sobre o mundo. Em um cenário em que a informação prolifera e a pseudociência ganha espaço, a filosofia da ciência torna-se uma ferramenta indispensável para discernir o conhecimento genuíno das meras crenças.

A ciência tem como um dos seus pilares fundamentais o método científico, que pode ser descrito em linhas gerais como o conjunto de procedimentos rigorosos que incluem a formulação de hipóteses, a coleta de dados empíricos, a análise crítica dos resultados e a revisão constante das teorias – ele constitui a espinha dorsal da ciência. A filosofia da ciência se dedica a analisar e aprimorar esse método, buscando garantir sua objetividade, confiabilidade e eficácia. Para tanto, a filosofia da ciência conta com alguns princípios básicos. A seguir, são brevemente descritos os principais.

O realismo científico – existe uma realidade objetiva independente da mente humana, e a ciência busca descrever essa realidade da forma mais precisa possível.

O materialismo – a visão de que a realidade é composta apenas por matéria e energia. Uma consequência importante deste princípio é que os fenômenos mentais são produtos de processos físicos e bioquímicos no cérebro. Dentro do materialismo, destaca-se o materialismo emergentista, uma perspectiva que reconhece a existência de níveis de organização da matéria, com propriedades emergentes que não podem ser reduzidas às propriedades dos seus componentes. Por exemplo, a consciência, para o materialismo emergentista, é uma propriedade emergente do cérebro, que surge da complexa interação entre os neurônios, mas que não se reduz a meras propriedades físicas dos neurônios individuais. Essa abordagem permite conciliar o materialismo com a complexidade do mundo natural, reconhecendo a existência de fenômenos que transcendem a mera soma das suas partes.

A filosofia da ciência também tenta elucidar a natureza fundamental das características mais gerais da realidade. Esta é a seara da Ontologia, que reflete sobre tempo, espaço, energia, matéria, propriedade, mudança, acaso, causalidade, probabilidade, estado, estrutura, sistema, vida, mente, sociedade e muitos mais. Se pergunta o que é uma lei natural e porque os fenômenos naturais obedecem determinadas leis da natureza, dentre outras questões. Na procura de respostas, sempre está informada pelos últimos avanços da ciência. Desta forma, clarificando esses conceitos, o cientista tem uma melhor perspectiva dos fundamentos do seu próprio campo de estudo. Estabelece-se assim um círculo virtuoso que resulta benéfico em ambos os sentidos.

A ontologia proposta por filósofos científicos modernos (ver Romero) é baseada em coisas (moléculas, átomos, partículas fundamentais, etc.), que são entidades ​​dotadas de propriedades (energia, pressão e temperatura no caso de entes macroscópicos, etc.). As coisas se combinam com outras coisas e formam sistemas. Os sistemas são agrupados em níveis de acordo com suas propriedades compartilhadas: físicas, químicas, biológicas, sociais e artificiais. Os sistemas que povoam cada nível emergem do nível anterior quando novas funções aparecem com complexidade crescente (como o exemplo da consciência mencionado acima). As mudanças das coisas são restringidas por leis naturais. Não há mudanças sem lei. Algumas mudanças são causais (desencadeadas por eventos anteriores) e outras são probabilísticas (estocásticas, mas ainda obedecendo leis). A propriedade comum de todas as coisas é a energia, que permite a capacidade de mudar. Objetos dotados de energia são chamados de materiais. A matemática e a lógica constituem ferramentas essenciais para a formulação de teorias precisas e a análise de dados complexos.

A filosofia da ciência não se limita a descrever a ciência, mas também a criticá-la. Ela questiona os pressupostos subjacentes às teorias científicas, analisa a validade dos métodos utilizados e avalia as implicações éticas e sociais da pesquisa científica. Em um mundo cada vez mais dependente da ciência e da tecnologia, é fundamental que a educação promova o pensamento crítico e a compreensão dos princípios da filosofia da ciência. Ao ensinar os alunos a questionar, analisar e avaliar criticamente a informação, a educação pode capacitá-los a tomar decisões informadas e a participar ativamente, eticamente e construtivamente da sociedade.

A pseudociência, que se apresenta como ciência, mas não segue seus princípios e métodos, representa um perigo para a sociedade. A filosofia da ciência fornece as ferramentas para identificar e combater a pseudociência, protegendo o público de informações enganosas e práticas prejudiciais.

A filosofia da ciência é um campo de estudo essencial para a promoção da ciência rigorosa, do pensamento crítico e da defesa contra a pseudociência. Ao fornecer um arcabouço conceitual e metodológico para a análise da ciência, a filosofia da ciência contribui para a busca da verdade e para o desenvolvimento de uma sociedade mais informada e racional.

Fontes:

Fontes das imagem destacadas: Quinteto de Stephan. Domínio público, imagem criada por N.A.S.A. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Quinteto_de_Stephan#/media/Ficheiro:Stephan’s_Quintet_taken_by_James_Webb_Space_Telescope.jpg

Gustavo Romero, Scientific Philosophy. Springer, 2018. https://doi.org/10.1007/978-3-319-97631-0

Mario Bunge, La ciencia: su método y su filosofía. Laetoli, 2013.

Para saber mais:

Mario Bunge, Caçando a Realidade. Ed. Perspectiva, 2010.

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