Terras Raras: Terra Soberana (V.8, N.8, P.1, 2025)

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Tempo de leitura: 4 minutos
#acessibilidade: Imagem de óxidos de terras raras. No sentido horário, a partir do centro superior: praseodímio, cério, lantânio, neodímio, samário e gadolínio. Fonte: WikiCommons

Texto pelo colaborador Artur Franz Keppler

Em todas as regras existem exceções e, para mim, nelas reside um estranhamento que chamo de beleza. Na tabela periódica, me interessava aquele puxadinho, aquela janelinha, aquele menu suspenso onde se escondem os (elementos) chamados de terras raras (Figura 1). São tão exóticos, tão caros, tão tóxicos ou radioativos que tem que ficar escondidos lá? – pensava eu. 

tp - Terras Raras: Terra Soberana (V.8, N.8, P.1, 2025)
Figura 1 – Tabela periódica destacando onde se escondem os (elementos) chamados de terras raras

Diferentemente dos nomes alcalino, halogênio, calcogênio, o nome composto “terras raras” remete a uma coisa concreta,  algo palpável, algo que uma criança consegue transmutar em palavras ou imagens: um oásis no deserto ou uma jardineira florida no meio de pedras estéreis. Diferentemente do seu nome, os terras raras são peculiares eletrônica e químicamente, em relação aos outros elementos químicos.

Há, porém, um elemento “terra rara” que de tão massivo, não cabe na tabela periódica. Seu núcleo não é de nêutrons e prótons, mas sim de ferro fundido. Sua massa é de 585 x 1018 toneladas e passa longe das 175 unidades atômicas do lutécio, o elemento terra rara mais “pesado”. Sua camada mais externa, não tem apenas elétrons, por lá circundam gases. Você já sacou que estou falando do “terra rara” mais raro do universo: o Planeta Terra. Ele é raro porque só aqui tem vida, tem você, tem conexão e ainda não encontraram outro ponto no universo com as mesmas características.

Antes de falarmos de química, vou falar de outra “terra rara”: o Brasil. Aqui temos abundância de água potável superficial, fauna e flora únicas, clima ameno, acesso ao mar e muitos outros predicados. Toda essa abundância combinada à interesses financeiros, extratores e colonizadores foram atraídos para cá. Ceifaram recursos e vidas nativas, em quantidades monstruosas. Devastar florestas, dragar rios e lagoas, passar o trator, abrir a porteira e deixar a boiada entrar, foi e continua sendo o modo de trabalho daqueles que insistem em tratar nosso país como terra sem dono. 

Tem dono, todos nós. Somos terras raras, somos terra soberana.

O neodímio, disprósio, praseodímio, térbio, cério são alguns exemplos de elementos insubstituíveis e por consequência, estratégicos para a produção de bens de consumo de grande escala, como motores elétricos (térbio, neodímio, disprósio), lâmpadas fluorescentes (ítrio, cério), telas sensíveis ao toque (gadolínio, térbio, európio, ítrio) e lentes de câmeras de smartphones (lantânio). O “ouro do século XXI” está aqui no nosso solo. Somos a segunda maior reserva de terras raras do mundo, mas ainda sem uma legislação específica para a exploração. Um ambiente caótico, perfeito para criar leis flexíveis e usarem a ameaça, o constrangimento e a chantagem como estratégia comercial. Essa é uma das tantas faces do neocolonialismo.

Com a certeza de que o recado foi dado,  que o Brasil é dos brasileiros, que a Terra é rara e redonda, deixo a química para o próximo texto. Continuem aí, atentos e despertos. Investir e acreditar na Ciência é soberania!

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nota:

Esse texto nasceu da minha inquietação com a descompensada política mundial, baseada em interesses comerciais, disfarçados sob os pretextos mais absurdos. Assim como o petróleo foi o motivo real por trás dos esfarrapados motivos de guerras anteriores, hoje recursos minerais são a bola da vez para firmar, sob chantagem, acordos comerciais com países que outrora eram tratados como parceiros. Em um cenário recente, vemos uma tentativa, por parte dos Estados Unidos, de colocar o Brasil novamente na posição de colônia extrativista.

Até o momento, o governo brasileiro se posicionou fortemente contra essa afronta. Que assim permaneça. Esperançemos!

É preciso ter esperança, mas ter esperança do verbo esperançar; porque tem gente que tem esperança do verbo esperar. E esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo…” – Paulo Freire

Somos terras raras, somos terra soberana.

Para saber mais:

Lula diz que criará comissão para mapear minerais críticos | CNN PRIME TIME, YouTube

‘Ouro do século 21’: EUA querem terras raras brasileiras, até hoje sem lei, UOL

Valiosas e versáteis: pesquisas com terras raras mostram caminho para criar cadeia produtiva no Brasil, Jornal da USP

Open-access Terras raras no Brasil: histórico, produção e perspectivas, SciELO Brazil

Leia também:

Cybertrucks sonham com lama digital? – pt.1 Minerais

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